domingo, 6 de abril de 2014

ABRAM O JOGO, CAMARADAS!

A líder do grupo, terrorista que tinha os codinomes Estela, Luiza, Patrícia e Wanda, era chamada de "Joana D'Arc da subversão". Foi a mesma terrorista que, juntamente com sua colega de quarto, conseguiu penetrar em um quartel e roubar armas e munição, levando tudo para a pensão em que moravam. Hoje seria muito bem chamada de Joana D'Arc da corrupção.
A esquerda brasileira é mais cínica que esquerda. Cometeu crimes absurdos, matou inocentes, esquartejou, dilacerou corpos e parece que não se lembra de nada. Acusa os militares de terem cometido crimes de tortura, mas não fala nas torturas praticadas pelos terroristas. Chama os militares de criminosos, mas não fala nos criminosos da esquerda. É muito fácil negar os crimes cometidos ou querer lançar lama no adversário. É um cinismo digno das esquerdas querer atribuir a si próprios a láurea de heróis. Porém, podemos refrescar a memória desses bandidos e lembrar parte desses crimes hediondos, que os terroristas urbanos e da selva insistem em "esquecer".
Foram muitos os crimes cometidos pela esquerda "em nome da democracia". Inúmeras vítimas, militares e civis, pontilharam com sangue o caminho desses bandidos. Muitos eram integrantes das Forças Armadas ou das forças policiais; outros eram civis, funcionários de bancos ou de outras empresas, vitimados nos atos terroristas. Outros, ainda, estavam nos lugares errados, nas horas erradas, e foram vitimados pelas camarilhas da esquerda. Nada tinham a ver com aquela luta desmiolada, mas foram vítimas assim mesmo. Vamos relembrar algumas vítimas daqueles assassinos, e como suas mortes ocorreram, para comparar o que esses vagabundos dizem com o que de fato ocorreu.
Aeroporto dos Guararapes, 1966
Em 25 de julho de 1966, no Aeroporto dos Guararapes, no Recife, terroristas empreenderam um atentado contra o Gen. Arthur da Costa e Silva. A explosão de uma bomba matou o jornalista Edson Régis de Carvalho e o Almirante Nelson Gomes Fernandes. Além das duas vítimas fatais, ficaram feridas 17 pessoas, entre elas o então coronel do Exército Sylvio Ferreira da Silva, que, além de fraturas expostas, teve amputados quatro dedos da mão esquerda, e Sebastião Tomaz de Aquino, o Paraíba, guarda civil que teve a perna direita amputada. "Um dos executores do atentado, revelado pelas pesquisas e entrevistas de Gorender, foi Raimundo Gonçalves de Figueiredo, codinome CHICO, que viria a ser morto pela Polícia Civil, em abril de 1971, já como integrante da VAR-PALMARES".
Soldado Mário Konzel Filho, 1968
Em 26 de junho de 1968, o soldado Mário Kozel Filho estava de sentinela no Quartel General do II Exército, em São Paulo. Às 04:30 horas da madrugada, ele estava vigilante em sua guarita. Naquele momento, um tiro foi disparado por uma sentinela contra uma camioneta que, desgovernada, tentava penetrar no Quartel. Seu motorista saltara dela em movimento, após acelerá-la e direcioná-la para o portão do QG. O soldado Rufino, também sentinela, dispara 6 tiros contra o mesmo veículo que, finalmente, bate na parede externa do quartel. Kozel sai do seu posto e corre em direção ao carro, para ver se há alguém no seu interior. Há uma carga com 50 quilos de dinamite que, segundos depois, explode e espalha destruição e morte num raio de 300 metros. Seu corpo foi dilacerado. Os soldados João Fernandes, Luiz Roberto Julião e Edson Roberto Rufino ficaram muito feridos. Foi mais um ato terrorista da organização chefiada por Carlos Lamarca, a VPR. Participaram daquele crime hediondo os terroristas Diógenes José de Carvalho Oliveira (o Diógenes do PT), Waldir Carlos Sarapu, Wilson Egídio Fava, Onofre Pinto, Edmundo Coleen Leite, José Araújo Nóbrega, Oswaldo Antônio dos Santos, Dulce de Souza Maia, Renata Ferraz Guerra Andrade e José Ronaldo Tavares de Lima e Silva.
Reportagem jornalística de 1969
Em Mongaguá, litoral paulista, foi traçado o plano da "Grande Ação", que ocorreu em 18 de julho de 1969, com o assalto e roubo do cofre na casa de um conhecido político da época, em Santa Teresa, bairro do Rio de Janeiro. O roubo rendeu 2,5 milhões de dólares,que os terroristas souberam aproveitar muito bem. O cofre foi aberto em Porto Alegre, a maçarico, pelo metalúrgico Delci. A disputa pelo butim dolarizado foi ferrenha! A líder do grupo, terrorista que tinha os codinomes Estela, Luiza, Patrícia e Wanda, era chamada de "Joana D'Arc da subversão". Foi a mesma terrorista que, juntamente com sua colega de quarto, conseguiu penetrar em um quartel e roubar armas e munição, levando tudo para a pensão em que moravam. Hoje seria muito bem chamada de Joana D'Arc da corrupção.

Ten. Alberto Mendes Junior, 
No dia 10 de maio de 1970 foi assassinado o Tenente Alberto Mendes Júnior, da Polícia Militar do Estado de São Paulo. O relato dos crimes cometidos pela esquerda refere-se a esse crime. "Naquela ocasião, Carlos Lamarca, Yoshitame Fugimore e Diógenes Sobrosa de Souza afastaram-se e formaram um tribunal revolucionário que resolveu assassinar o Tenente Mendes, pois o mesmo, pela necessidade de vigiá-lo, retardava a fuga. Os outros dois, Ariston Oliveira Lucena e Gilberto Faria Lima, ficaram vigiando o prisioneiro. Poucos minutos depois, os três terroristas retornaram, e, acercando-se por traz do oficial, Yoshitame Fugimore desfechou-lhe violentos golpes na cabeça, com a coronha de um fuzil. Caído e com a base do crânio partida, o Tenente Mendes gemia e se contorcia em dores. Diógenes Sobrosa de Souza desferiu-lhe outros golpes na cabeça, esfacelando-a. Ali mesmo, numa pequena vala e com seus coturnos ao lado da cabeça ensangüentada, o Tenente Mendes foi enterrado". A esquerda não fala nesse crime, certamente tido como ato heróico.
Major do Exército José Júlio Toja Martinez 
Em 4 de abril de 1971 foi assassinado o Major do Exército José Júlio Toja Martinez, que, com sua equipe estava vigiando uma casa ocupada por terroristas. "Por volta das 23 horas desse dia, chegou, num táxi, um casal, estacionando-o nas proximidades da casa vigiada. A mulher ostentava uma volumosa barriga que indicava estar em adiantado estado de gravidez. O fato sensibilizou Martinez, que, impelido por seu sentimento de solidariedade, agiu impulsivamente visando preservar a "senhora" de possíveis riscos. Julgando que o casal nada tinha a ver com a subversão, Martinez iniciou a travessia da rua, a fim de solicitar-lhe que se afastasse daquela área. Ato contínuo, de sua "barriga", formada por uma cesta para pão com uma abertura para saque da arma ali escondida, a mulher retirou um revólver, matando-o instantaneamente, sem qualquer chance de reação. O capitão Parreira, de sua equipe, ao sair em sua defesa, foi gravemente ferido por um tiro desferido pelo terrorista. Nesse momento, os demais agentes desencadearam cerrado tiroteio, que causou a morte do casal, identificados como sendo os terroristas do MR-8 Mário de Souza Prata e sua amante Marilena Villas-Bôas Pinto, ambos de alta periculosidade e responsáveis por uma extensa lista de atos terroristas.
O Araguaia foi palco de muitos crimes hediondos praticados por esses bandidos travestidos de guerrilheiros. Para que vocês não digam que estou mentindo, vou reproduzir trechos do discurso do Coronel Lício Maciel, testemunha, como participante, da luta contra os terroristas do Araguaia. O Coronel Lício Maciel, em sessão solene na Câmara dos Deputados, para homenagear os soldados mortos no Araguaia, descreveu muitas ações. Como aquela que resultou na prisão do guerrilheiro Pedro Albuquerque, em Fortaleza, quando tentava obter documentos. De lá foram para o Araguaia, como descreveu o próprio Coronel Lício Maciel: 


Chegamos ao Rio Araguaia, pegamos uma canoa grande, com motor de popa, fomos até ao local de Pará da Lama. Pedro deve lembrar muito dele: era uma picada ao longo da floresta no sentido do Xingu. Andamos o dia inteiro. Chegamos ao anoitecer na casa do último morador, com o Pedro sendo levado por nós, livre. Não estava algemado, amarrado ou coisa assim. Ele foi acompanhando a nossa equipe. Há várias testemunhas desse episódio aqui presentes, as quais não vou citar, que fizeram parte da minha equipe. Chegamos à casa de Antônio Pereira, pernoitamos no campo, nos telheiros e, no dia seguinte, às 4h, prosseguimos em direção ao local onde Pedro Albuquerque indicou.

A operação no Araguaia, àquela altura, era de reconhecimento. Com base em informações obtidas de Pedro Albuquerque, a equipe do Cel. Lício tratou de desbravar o terreno para confirmar a presença de guerrilheiros na área. É o Coronel Lício quem descreve a evolução da operação. 


Chegamos à casa de Antônio Pereira, pernoitamos no campo, nos telheiros e, no dia seguinte, às 4h, prosseguimos em direção ao local onde Pedro Albuquerque indicou. Ao chegarmos lá, avistamos 3 homens, isto é, 3 elementos, sendo uma mulher, descansando para almoço, presumo. Aproximamo-nos do local só para conversar com eles, para saber o que eles estavam fazendo lá. Eram 3 e, no nosso grupo, havia 6, então, não tinha problema. Eles fugiram. Chegamos ao local e fiquei inteiramente abismado com o estoque de comida, de material cirúrgico, até oficina de rádio tinha, 60 mochilas de lona, costuradas no local em máquina industrial grande, que tive o prazer de jogar no meio do açude. Tocamos fogo em tudo e voltei sem fazer prisioneiro. Ora, em qualquer situação, teríamos atirado naqueles homens. Estávamos a 80 metros, um tiro de fuzil os atingiria facilmente. Eles estavam sentados. Mas o nosso objetivo não era matar, não era trucidarO nosso objetivo era saber o que eles estavam fazendo lá.De acordo com Pedro Albuquerque, eram guerrilheiros. Estavam na área indicada por Pedro Albuquerque, que viu toda a operação.

Nós continuamos na missão. Como os três elementos fugitivos avisaram para o resto do grupo do Destacamento C, mais ao Sul, em frente a São Geraldo do Araguaia, que estávamos indo para lá, ao chegar lá nós os vimos fugindo com muita carga, até violão levavam. Eles estavam se retirando do Destacamento C, do Antônio da Dina e do Pedro Albuquerque. Pedro Albuquerque nos levou até o Destacamento C, onde havia estado. Ele fugiu porque os bandidos exigiram que ele fizesse um aborto em sua mulher, que estava grávida. Eles não se conformaram com a ordem, principalmente porque outra guerrilheira grávida tinha sido mandada para São Paulo para ter o filho nas mordomias daquela cidade. Ela era casada com o filho do chefe militar da guerrilha, Maurício Grabois.
Genuíno incitando o terrorismo no Araguaia
O Cel. Lício, continuando sua narrativa, acrescentou que "não sei, não posso me lembrar, se foi o Cid ou se foi o Cabo Marra que pegou o Genoino. Esse elemento era o Geraldo, posteriormente identificado como Genoino. Ele foi recolhido ao xadrez, posteriormente enviado a Brasília. Em seguida, três, quatro dias, veio o veredicto da identificação: o guerrilheiro Geraldo é o José Genoíno Neto. O grupo do Genoíno prendeu um filho do Antônio Pereira, aquele senhor humilde, que morava nos confins da picada de Pará da Lama, a 100 Km de São Geraldo. O filho dele era um garoto de 17 anos, que eu não queria levar como guia, porque, ao olhar para ele, me lembrei do meu filho, que tinha a mesma idade. Então eu disse ao João: Não quero levar o seu filho. Eu sabia das implicações ou já desconfiava. O pobre coitado do rapaz nos seguiu durante uma manhã, das 5h até o meio-dia, quando encontramos os três nos aguardando para almoçar. Pois bem. Depois que nos retiramos, os companheiros do José Genoíno pegaram o rapaz e o esquartejaram. Genoíno, aquele rapaz foi esquartejado, toda Xambioá sabe disso, todos os moradores de Xambioá sabem da vida do pobre coitado do Antonio Pereira, pai do João Pereira, e vocês nunca tiveram a coragem de pedir pelo menos uma desculpa por terem esquartejado o rapaz. Cortaram primeiro uma orelha, na frente da família, no pátio da casa do Antonio Pereira. Cortaram a segunda orelha, o rapaz urrava de dor, e a mãe desmaiou. Eles continuaram, cortaram os dedos, as mãos e no final deram a facada que matou João Pereira. Eles fizeram isso porque o rapaz nos acompanhou durante 6 horas, a fim de servir de exemplo aos outros moradores para não terem contato com o pessoal do Exército, das Forças Armadas". Aquele crime foi um ato de verdadeira tortura antes da morte da vítima. Ninguém da esquerda quer falar nisso.
Algo parecido só encontrei quando trucidaram o Tenente Alberto Mendes Júnior. O tenente se apresentou voluntariamente para substituir dois companheiros que estavam feridos. A turma do Lamarca pegou o rapaz, trucidou, castrou e o obrigou a engolir os órgãos genitais. Então, ao Tenente Alberto Mendes Júnior foi feito isso, mas o crime contra o João Pereira foi muito mais grave, muito mais horrendo. E eles sabem disso. Peçam desculpas para o Antonio Pereira, se ele estiver vivo. Tenham a coragem de reconhecer que toda Xambioá sabe disso.
Genuíno, preso no Araguaia, sem qualquer arranhão.
Genoíno preso e identificado, a guerrilha prosseguiu. 

Depois de matar o João Pereira, eles mataram o Cabo Odílio Cruz Rosa depois do Rosa, eles mataram dois Sargentos depois dos dois Sargentos, eles atiraram no Tenente Álvaro, que deve contar a história. 

Na minha versão, o Álvaro deu voz de prisão para o bandido eles atiraram. O outro que estava do lado ou atrás atirou nas costas do Álvaro, arrancando-lhe a omoplata.
Os mortos da guerrilha não podem, com Justiça, serem apontados como vítimas. Quando optaram pela luta armada, sabiam dos riscos envolvidos na ação. Sabiam que as forças de segurança iriam combatê-los. Sabiam que poderiam morrer em ação. Sabiam que seria uma ação ilegal e altamente perigosa. Hoje as famílias dos terroristas mortos recebem indenização, como se eles tivessem sido vítimas de um crime cometido pelo Estado, mas os que foram assassinados pelos terroristas nada recebem. Por esse raciocínio, também os traficantes, assaltantes e seqüestradores poderiam pedir indenização. Nenhum de vocês é melhor que eles. Vocês também não assaltaram e mataram como eles fazem? As monstruosidades cometidas por vocês, como o assassinato do Tenente Alberto Mendes Júnior, do Soldado Mário Kozel Filho, e do mateiro João Pereira, foram muito mais graves que a morte de qualquer "guerrilheiro". Os guerrilheiros não foram assassinados, morreram em combate, o que foi absolutamente natural e já era esperado, inclusive por vocês. Quem se mete em uma guerra de guerrilha é pra morrer mesmo!
Na versão de vocês, a luta foi ato de heroísmo. Pura mentira! Assaltar uma casa e roubar um cofre com US$ 2,5 milhões, pondo o dinheiro no bolso, não é ato de heroísmo: é roubo descarado! Quem rouba armas e munição de um quartel não é heroína: é ladra mesmo! Mutilar uma vítima, orelha por orelha, dedo por dedo, mão por mão, é um crime hediondo. Ponham isso na cabeça! Assaltar bancos e outras empresas, matando os vigilantes e gerentes, não é ato digno de um homem íntegro: é ato digno de vagabundos aproveitadores, como vocês. 


Querer implantar aqui uma ditadura nos moldes da então União Soviética não é ato de idealistas: é ato de traição ao Brasil. Hoje vocês posam de "heróis da resistência", como se pretendessem resistir a alguma força contrária aos interesses do Brasil, como os franceses resistiram ao nazismo e os poloneses resistiram ao ataque soviético. Outra grande mentira! Tenham vergonha na cara e digam a verdade! Vocês não queriam implantar nenhuma democracia no Brasil. Em nenhum documento das organizações de esquerda, inclusive dos partidos, havia alguma referência à palavra democracia. Vocês pretendiam implantar a ditadura do proletariado. Como têm o descaramento de falar em democracia? Por acaso a União Soviética era uma democracia? Os países do leste europeu eram democracias? Cuba é uma democracia? A China é uma democracia? Chega de cinismo! Chega de posar como heróis! Chega de simulações democratas! Digam a verdade sobre o que vocês pretendiam e ainda pretendem fazer no Brasil. Digam que depois da vitória (se ocorresse ou se ocorrer) viria ou virá o paredão, como ocorreu na União Soviética, no leste europeu, na China e em Cuba. Sejam homens ao menos uma vez na vida! Abram o jogo, camaradas!

(ESCRITO POR CARLOS JOSÉ PEDROSA no ano de 2010/http://www.midiasemmascara.org)

quinta-feira, 3 de abril de 2014

EU ASSUMI PARA SER DEPOSTO


Revela o apoiador do golpe, que depois garantiria a volta dos milicos para casa
'Eu assumi para ser deposto'
"AE"
Trigésimo primeiro mandatário brasileiro, ele hoje se define num rasgo de sinceridade: "Fui um presidente improvisado, que assumiu para ser deposto". Mas a morte prematura de Tancredo Neves, de quem era vice, não só lhe abriu o caminho para chegar ao Planalto, como jogou em suas mãos a tarefa (histórica, diga-se) de conduzir os destinos do País num tempo de total incerteza política, fragilidade institucional e caos econômico. Nesta entrevista exclusiva, José Sarney, aos 83 anos de idade, repassa o percurso desde o momento em que se posicionou contra João Goulart - "como ele era apoiador de Vitorino Freire, meu tradicional inimigo político no Maranhão, então eu era anti-Jango" - até o momento em que se viu frente a frente com os militares em 1985, garantindo-lhes, já como presidente, que poderiam retornar aos quartéis, seguros de que a transição democrática seria feita com eles, e não contra eles.
"Cumpri esse acordo, sem deixar hipoteca para trás", pondera. Aliado de primeira hora do regime, conta que teve momentos difíceis com Costa e Silva e Médici, em contraste com o bom trânsito com Castelo. E reconhece que sua proximidade com o generalato ajudou bastante a montagem da candidatura de Tancredo Neves à Presidência: "Eu ainda pude lhe dizer 'Tancredo, você não governa sem base militar'". Ao fim de três horas de conversa, o senador longevo faz uma confissão à repórter: admite que deveria ter se despedido da vida pública e ido para casa ao passar a presidência para Collor de Mello, em 1990. "Ali eu já havia cumprido a minha missão. Me arrependo de ter continuado na política".

Onde o senhor estava quando aconteceu o golpe militar, há 50 anos?

Em Brasília. Não se sabia ao certo o que estava acontecendo. Atravessávamos um momento de dificuldades, grande insatisfação e agitação pelo País. Eu estava no segundo mandato como deputado federal, era membro do diretório nacional da UDN e não tinha contato com setores que pudessem estar articulando uma revolução contra o poder constituído. Dias antes, em 19 de março, fiz um discurso na Câmara pregando a conciliação, alertando que não poderíamos deixar o País marchar para uma ruptura institucional. Que deveríamos nos esforçar para que jamais isso ocorresse.

Qual era a sua posição em relação ao presidente João Goulart?

Eu era entrosado dentro do meu partido, a UDN. Fora isso, no meu Estado, o Maranhão, Jango prestigiava o Vitorino Freire, que era meu tradicional inimigo político. Então, eu tinha uma posição clara: era contra o Jango.

Sendo assim, o senhor de alguma forma teve sinais do que viria a acontecer ao presidente?

Quando recebemos as primeiras notícias do deslocamento de tropas de Minas para o Rio, o único contato estreito de que eu dispunha naquele momento era o (então governador mineiro) Magalhães Pinto. Liguei e consegui falar com ele. Perguntei se era verdade que havia tal movimentação. Ele confirmou que os generais Carlos Luiz Guedes e Olympio Mourão Filho estavam se dirigindo para o Rio. Diante disso, vi que já não era possível impedir as Forças Armadas de agir, especialmente depois que o presidente participou daquele ato de insubordinação dos sargentos.

Como chegou a essa percepção?

1964 foi a última das intervenções salvacionistas implantadas pelos militares no Brasil, na perspectiva daquilo que o almirante Custódio de Melo (foi ministro da Marinha e das Relações Exteriores no governo Floriano Peixoto) chamava de "a destinação histórica das Forças Armadas". Ou seja, intervir sempre que as instituições estivessem em crise. A primeira dessas intervenções foi a própria República, que já nasceu como uma questão militar, fruto de fermentação que vinha desde o Império. Depois, em 22, 24, 30, 32, 50, 54, 60, tem-se uma série dessas intervenções. A de 64, inclusive, foi capitaneada por aqueles mesmos tenentes do passado, já mais velhos - é o Cordeiro de Farias, o Brigadeiro Eduardo Gomes, o Costa e Silva, os irmãos Geisel.

Em que momento os militares sentiram que poderiam ser vitoriosos em 1964?

Eles tentaram ter o controle da situação na renúncia do Jânio. Não deu certo. Mas quando conseguiram atrair o Castelo Branco para o seu movimento, deu-se aquele ponto de inflexão que abre a possibilidade da vitória. E por que foi decisivo atrair o Castelo Branco? Porque ele era um legalista de vida inteira, tanto que o Juscelino o convidou para a presidência da Petrobrás e ele recusou dizendo que, como soldado, não poderia nunca ocupar um cargo civil. A adesão do Castelo foi chave. Ele tinha o respeito das tropas, não fazia parte de grupos, era tido como herói da FEB, grande estrategista, professor respeitado, senhor de posições sempre coerentes. A única vez assinou um manifesto foi para pedir a renúncia do Getúlio em 1954. Cobrado por isso, disse que não fora uma atitude pessoal, mas coletiva, em consonância com o generalato.

O que pesou mais no desenrolar dos fatos, na sua opinião: o contexto mundial ou a atuação do presidente João Goulart?

Temos a obrigação de contextualizar a paisagem de 1964. Sem isso não se compreende o que aconteceu. Os americanos tinham interesses aqui na região? Claro que tinham, tanto que governos foram sendo derrubados um após o outro - Argentina, Peru, Equador.... Além disso, vivíamos a Guerra Fria e estivemos perto de um conflito nuclear com a descoberta dos mísseis em Cuba. O clima já era tenso e havia quem jogasse mais fogo. Eu me lembro de uma declaração do Fidel Castro dizendo que, se fosse brasileiro, em dez dias derrubaria o Castelo Branco. Aquilo caiu muito mal aqui. Também acredito que Jango tenha feito de tudo para criar uma situação insustentável, porque não é possível entender, com a distância do tempo, como ele cometeu tantos erros naquele momento.

A que erros o senhor se refere?

Comparecer a um ato de rebeldia militar e ainda fazer discurso a favor da sublevação de cabos e sargentos contra os seus superiores. Justo ele, o comandante-em-chefe das Forças Armadas! Foi um erro incontornável. Tanto que o general Amaury Kruel (ex- ministro da Guerra de Jango), que era muito amigo dele, disse que não fizesse aquilo. Jango colocou em todos os comandos do Exército homens da sua extrema confiança. E depois colocou em xeque o papel institucional das Forças Armadas. Não dá para entender. Com habilidade maior, teria completado o mandato, pois as eleições não tardariam. E Juscelino seria eleito presidente.

Houve também um movimento para a permanência de Jango no poder?

Sim, o que também foi visto como meio de subverter as instituições. Não era um movimento forte, mas causou certo efeito. A meu ver, só fez aumentar a impopularidade do presidente, uniu contra o seu governo todos os jornais, depois setores produtivos e finalmente as Forças Armadas. Jango criou seu próprio isolamento - e historiadores hoje conseguem demonstrar bem isso. O que nos leva a pensar que ele talvez quisesse alcançar esse paroxismo, para depois ir embora. Ao participar do ato dos sargentos, talvez já soubesse que iria sair. Mas pode ter pensado "vou sair por cima".

Por que 1964 terá sido a última intervenção militar salvacionista no Brasil?

Porque houve um esgotamento fechando um longo ciclo. Antes de 1964, os generais não tinham regras claras de permanência no Exército. Eles atuavam como generais chineses, donos de exércitos. O Cordeiro (de Farias) tinha o seu grupo, o (Henrique Teixeira) Lott tinha o dele, os Geisel, também. O Castelo então limitou a permanência dos oficiais a quatro anos em cada posto. E a 16 anos na patente. Isso quebrou a espinha dorsal de uma estrutura que produzia facções que eram verdadeiros partidos políticos dentro do Exército. Só Castelo poderia fazer isso, porque era um militar de visão grande.

Em que medida o regime implantado em 1964 rompeu com o legado varguista?

Getúlio era um homem formado no positivismo castilhista e borgista do Rio Grande do Sul, o que explica seu perfil autoritário. Mas, ao deixar o Rio Grande, ele mudou de personalidade. Tornou-se o Getúlio esperto, ardiloso, passador de rasteiras, e assim atraiu o militares. Finda a Segunda Guerra, no entanto, os militares voltaram imbuídos de que o mundo deveria ser outro, a humanidade deveria atravessar um longo período de paz e deveria se buscar a vertente democrática. Getúlio ficou antiquado nesse contexto. Retornou ao poder em 1950, mas já não sabia lidar com os militares. Conseguiu perder a confiança até na guarda que fazia sua segurança no Catete, o que o levou a buscar proteção em capangas como o Gregório, bem ao estilo do Sul. Hoje podemos ver com clareza os efeitos negativos da figura do "pai dos pobres". Ver como o peleguismo sindical atrasou o Brasil. Isso só desaparece com a eclosão do sindicalismo de Lula, no ABC. Ali houve uma ruptura com o legado de Vargas.

Como os militares viram a emergência daquele novo sindicalismo?

Foi o Paulo Egydio quem levou ao general Golbery do Couto e Silva a notícia de um sindicalismo moderno no ABC, e o general achou aquilo muito bom, tinha até simpatia pelo movimento. Era o início de um Brasil diferente, com certo equilíbrio nas relações capital/trabalho. Getúlio não estava preparado para governar no regime democrático e saiu por uma porta genial, que foi o suicídio. Aquela bala matou a UDN e colocou-o na história. Como ele mesmo postulou.

O senhor presenciou o aprofundamento das diferenças entre o general Castelo Branco e seu sucessor, Costa e Silva. Que lembranças guarda disso?

Não há dúvida de que o plano do Castelo era terminar o mandato do Jango com eleições. Costa e Silva, por sua vez, formou o Alto Comando Revolucionário e, como oficial mais antigo, quis deixar claro que não queria o Castelo. Foi obrigado a aceitar. Uma vez ouvi do próprio Castelo que ele era muito cobrado por não enfrentar o Costa e Silva. E Castelo respondia dizendo não querer repetir o que acontecera entre os marechais Deodoro e o Floriano, aquele embate feroz que acabou dividindo as Forças Armadas. Só que o Castelo foi para o governo e logo começou a dar trombadas. A mais danosa para a sua imagem deu-se justamente quando Costa e Silva encaminhou o pedido de cassação do JK, à sua revelia. Castelo terminou sucumbindo à pressão do Costa e Silva, cassou o JK, no entanto chamou o Luís Vianna Filho, seu chefe do gabinete civil, ordenando que ele informasse à imprensa que Juscelino fora cassado por motivos políticos, não por corrupção.

A convocação de eleições para o governo dos Estados também opôs os dois generais?

Sim. Querendo cumprir o calendário que havia se proposto e fiel à ideia de fazer uma intervenção restauradora, Castelo fez as eleições de 1965, contra a vontade de Costa e Silva. Foram eleitos políticos como Negrão de Lima, pelo Estado da Guanabara, Israel Pinheiro , por Minas Gerais, e os militares da linha-dura diziam que não se daria posse a eles. Ali o Castelo ficou ameaçado de ser deposto. E saiu-se com aquela frase famosa, de que ele era o comandante-em-chefe das Forças Armadas, portanto, ele daria a posse, e não os oficiais do Exército, aos quais caberia obedecer. Costa e Silva então foi a Minas, para uma reunião com Castelo presente, e lá fez um discurso radical, censurando as eleições para governador. Castelo ficou calado. Ali foi construído um acordo, cujo principal articulador terá sido o Juracy Magalhães (embaixador do Brasil nos EUA e ministro da Justiça no governo Castelo Branco), e do qual sairia o AI-2, segundo o qual os governadores tomariam posse, mas com poderes restringidos. Hoje estou certo de que, não fosse o Castelo, 1964 teria degenerado numa quartelada, abrindo espaço para um ditador personalista, ao estilo do Pinochet. Castelo imaginou enquadrar a linha-dura com a Constituição de 1967. Não aconteceu. Costa e Silva, seu sucessor justamente, chega ao poder e baixa o AI-5. Aí a coisa degringolou.

O senhor participou dessa eleição para governador, em 1965, e foi eleito pelo Maranhão. Como era a sua relação como governador com o poder central?

Vou contar um caso. Com três dias de empossado, o comandante militar no Maranhão me pediu uma audiência e foi quando conheci a figura do S2, o oficial de informação. Ou seja, o comandante veio acompanhado do S2. Daí me entregou um ofício determinando que eu substituísse dois secretários meus, por serem comunistas. Li o ofício e disse "olha, comandante, eu não vou devolver o documento para não ser indelicado. Mas o senhor entregou-o à pessoa errada. Deveria entregá-lo ao presidente da República, porque eu fui eleito pelo povo, portanto, vou cumprir meu dever da melhor maneira possível, com todas as minhas forças e melhores das intenções. Mas, reconheço que sou um funcionário público e que o presidente pode me botar para fora. Então, vá direto a ele, comandante, porque aqui quem governa sou eu".

E como se resolveu o impasse?

No Rio de Janeiro, contei o episódio ao Castelo, que disse: "O senhor fez muito bem. Ele não tinha que se meter". Dois governadores no Nordeste foram respeitados pelos militares: João Agripino, na Paraíba, e eu, no Maranhão. Porque estávamos fazendo bons governos e porque não nos submetemos. Meu governo esteve sob vigilância, achavam que eu havia levado comunistas para o palácio. Tanto que quando terminei meu mandato, pegaram um secretário meu e prenderam por dez dias. Foi uma maneira de mostrar quem mandava. No Maranhão não precisamos de anistia, porque não demiti ninguém com base nos Atos Institucionais. E, quando da decretação do AI5, não passei um telegrama para Brasília. Fui o único governador a não enviar cumprimentos. E me preparei para ser afastado.

Acredita ter corrido o risco da cassação?

Naqueles dias de 1968, o presidente Costa e Silva convocou todos os governadores para uma reunião e então disse que uma coisa me olhando: "Fui aconselhado a cassar alguns governadores, mas não fiz isso para não destruir a Federação. E nem abalar o Supremo". Sim, porque quando ele estava lá no Alto Comando, havia proposto a dissolução não só do Congresso, mas do Supremo.

Como o senhor se saiu no período Médici?

Aí piorou, porque o general Medici até me hostilizou. Ele não foi ao Maranhão nenhuma vez em meu governo. E a estrada que fiz, de São Luiz a Teresina, foi inaugurada por ele em Teresina. A estrada toda corre toda no Maranhão, mas o Médici inaugurou no Piauí! Quando decidi concorrer ao Senado, fui comunicá-lo pessoalmente. E disse: saio para ser ou não candidato. Ele só me olhou, sem dizer nada.

O Senado marcou uma inflexão da sua carreira política, correto?

Sim. Cheguei ao Senado e logo me liguei ao Sacro Colégio, grupo que se reunia secretamente, com o propósito de evitar choques entre governo e oposição. Faziam parte do Sacro Colégio Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, Franco Montoro, Teotonio Vilela, Roberto Freire, entre outros, e a coisa funcionou bem, pois evitamos que as crises chegassem a um ponto de ruptura e o Congresso pudesse ser fechado. Tínhamos em mente a reação do regime ao discurso do (deputado oposicionista) Márcio Moreira Alves, em 1968, quando o Congresso foi fechado, de fato. Lembro de uma visita do ex-presidente chileno Eduardo Frei Montalva a Brasília, naqueles tempos. Ele já estava bem doente, então fizemos um almoço em sua homenagem no Congresso mesmo. Foi quando ele nos disse "vocês façam tudo para o Congresso não desaparecer, pois só sabe o que a liberdade representa aquele que a perde. A chama da democracia não pode apagar".

O que o moveu a aceitar ser vice na chapa do Tancredo?

Eu não aceitaria a candidatura presidencial do Paulo Maluf, pelo PDS, em primeiro lugar. E também havia um movimento para prorrogar o mandato do Figueiredo. A reação a tudo isso entrou pela porta da minha casa: vi meu filho Zequinha, que já era deputado, votar a favor das Diretas Já. Disse a ele que me orgulhava do seu voto. E disse a mim ter chegado a hora de ir para casa. Renunciei à presidência do PDS. Mas aí o Ulysses resolveu namorar comigo. Ia quase todo dia à minha casa, "você não pode ficar de fora e não ajudar o Brasil nesse momento...". Recusei, mas daí o Aureliano Chaves me chamou também, pregando a união e dizendo que o partido iria indicar o vice na chapa do Tancredo. Sugeri o nome do Marco Maciel. Foi quando o Tancredo, certa noite, mandou um avião me buscar em Brasília, para um jantar na casa do (escritor) Murilo Mendes, em Belo Horizonte. Fui. Murilo e sua senhora me receberam, Tancredo estava com a dona Risoleta. Enquanto as duas mulheres conversavam, os três homens tramavam.

O que exatamente?

Tancredo disse que o vice teria que ser eu e que essa seria uma das condições para ele deixar o governo de Minas e encabeçar a chapa. Reagi, "mas, Tancredo, eu fui presidente do PDS....". E aí ele veio com o argumento fatal: "Então você conhece o mapa da mina, sabe como os delegados vão para a convenção e pode articular muito mais". Lá pelas duas ou três horas da manhã disse que aceitaria, com uma condição: se não encontrassem um nome que agregasse mais. No dia seguinte, em Brasília, Aureliano bateu na mesa e disse "sem você na chapa, não tem aliança". Ulysses foi também muito correto comigo. A partir daí comecei a articular: construímos uma dissidência grande, evitamos a eleição do Maluf, a continuidade do Figueiredo e os militares aceitavam o Tancredo. Pude dizer a Tancredo: "Não pense que pode ser presidente sem uma base militar lhe sustentando".

As ligações com os militares foram sua maior contribuição naquele momento?

Ajudaram bastante. Logo procurei o general Leônidas (Pires Gonçalves, foi chefe militar na Amazônia e no Sul, depois ministro do exército apontado por Tancredo e durante todo o governo Sarney), estive muitas vezes com ele. Leônidas ficou montando uma base de resistência no 3º Exército, no Rio Grande do Sul. Procurei o brigadeiro Murilo Santos, que começou a articular na Aeronáutica. O Tancredo fez algo parecido em Minas Gerais, com o general Bayma Denys, e o Aureliano, com o almirante Maximiniano da Fonseca. Isso foi fundamental, pois na noite que o Tancredo caiu doente, o ministro do Exército do Figueiredo, Walter Pires, ao saber que eu assumiria, ameaçou levantar os quartéis para impedir a posse. Estávamos preparados para resistir.

Qual era o seu estado de espírito ao assumir a presidência, depois de um mês de suspense em torno da saúde de Tancredo?

Fui a última pessoa a acreditar que ele morreria. Porque aquilo pesava enormemente nos meus ombros. Eu vinha de um Estado pequeno, mal me preparara para ser o vice, não tinha participado das articulações para formar o ministério, não tinha plano de governo nem equipe, e, de repente, cai no meu colo a responsabilidade de fazer a transição democrática brasileira. A primeira coisa que pensei: preciso me legitimar logo ou serei deposto. Tancredo poderia adiar as coisas com as quais tinha se comprometido, inclusive a convocação da Constituinte. Mas eu não tinha esse timing. Tinha que fazer tudo rapidamente, ou as forças que emergiam da clandestinidade, e precisavam de espaço político, iriam se manifestar. O que fiz? Legalizei o Partido Comunista, acabei com as restrições aos sindicatos, dei anistia a trabalhadores, acabei com os municípios de segurança nacional, fiz eleição direta para prefeito em seguida, até o Ulysses me disse que era loucura, enfim, abri os espaços da liberdade logo de saída. Só depois parti para o plano econômico. E paguei caro por isso: enfrentei 12 mil greves no meu governo.

O que contou mais na estabilização da sua presidência, a Constituinte ou o Plano Cruzado?

Se não fosse o Cruzado, não teríamos tido condição de fazer a Constituinte, que foi uma obra de engenharia política, num tempo muito difícil. O Plano Cruzado foi importantíssimo, a partir dele conseguimos sair das fórmulas ortodoxas e entramos nas heterodoxas. Eu jamais aceitaria a fórmula do FMI. Depois vieram os outros planos, Cruzado 2, Bresser, Verão, e eu sempre me valendo dos colaboradores de circunstância, já que assumi sem equipe. Foram planos com problemas, mas, sem eles, não teria sido possível o Real.

Por quê?

O Plano Real passou pelas minhas, trazido pelo João Sayad, meu ministro do Planejamento. Reconheci que não teria mais condição de implantar aquilo. Mais tarde, quando Fernando Henrique chegou ao ministério da Fazenda, foi falar com os técnicos e o plano estava pronto. A verdade é que, quando o Cruzado começou a ter dificuldades, os economistas bateram em retirada. Não sabiam que efeitos aquilo surtiria, não tinham certezas. A meu ver, o grande mérito do Cruzado foi ter tido a coragem de romper com a ortodoxia.

O senhor se considera o condutor da transição democrática no Brasil?

Estudiosos dizem que conseguimos fazer a melhor transição da América do Sul. Há alguns fatores a ponderar. Primeiro: não deixei para trás hipoteca pendurada com os militares. Eles voltaram aos quartéis, depois que fechei o acordo de que a transição seria com eles, e não contra eles. Eu lhes dei essa garantia. Construímos uma Constituição democrática, avançamos no plano econômico, fomos para o "tudo pelo social". Esses programas que estão aí já haviam começado no meu governo - combate à fome, distribuição de leite, vale-transporte, tudo vem daquele tempo. O crescimento no meu governo foi 5% ao ano e hoje não se fala nisso! Os preços subiam, sim, mas subiam os salários, imediatamente. Com isso fizemos um colchão que nos protegeu de seguir o Fundo, com sua fórmula criada para a Europa. E saiba que se eu tivesse cedido ao FMI, teria sido deposto. Foi um governo de trepidações, sim, mas exitoso ao criar uma sociedade democrática. Um governo que terminou com um operário concorrendo à presidência da República, o que era inimaginável naqueles tempos.

Acha que a História não lhe faz justiça, Presidente?

Ainda vai fazer. A transição democrática brasileira se deve ao meu temperamento, também, esse jeito nordestino de dialogar. Cometi um erro ao voltar à política quando encerrei meu mandato presidencial. De novo, deveria ter ido para casa, mas daí veio o Collor, com todos aqueles problemas, e me chamaram de volta, isso, antes do impeachment. Saí então senador pelo Amapá, porque o PMDB não me deu legenda no Maranhão. Mas, enfim, olhando para esse meu retorno, vejo-o com arrependimento.Já havia encerrado a missão maior, que foi a transição democrática. E é só o que o País deve a este presidente improvisado, que assumiu para ser deposto.

(Por Laura Greenhalgh* - O Estado de S.Paulo, estadao.com.br)